Muito já se disse que a Globo estaria fazendo sua versão de "Game of Thrones". A influência da série da HBO é nítida, mas também há muito da Disney
TONY GOES - As novelas que se passavam em outras épocas e países distantes eram a regra nos primórdios da TV brasileira. Até que, em 1968, a novela "Beto Rockfeller", na extinta Tupi, trouxe o Brasil contemporâneo para a nossa teledramaturgia.
Mais de 20 anos depois, Cassiano Gabus Mendes -criador de "Beto", que foi escrita por Bráulio Pedroso- deu um rumo inesperado à revolução que ele mesmo iniciara.
Então na Globo, o autor lançou "Que Rei Sou Eu?", um retorno ao gênero capa-e-espada, na faixa das 19 horas. Cheio de referências à situação brasileira no final da década de 1980, o folhetim foi um triunfo de crítica e audiência.
Mesmo assim, foram precisos quase 30 anos para a emissora retornar ao filão com "Deus Salve o Rei", que estreou nesta terça (9), no mesmo horário que sua ilustre antepassada.
Também repleta de príncipes e castelos, a trama desta vez se passa em uma Idade Média imaginária ("Que Rei Sou Eu?" remetia ao século 18).
Muito já se disse que a Globo estaria fazendo sua versão de "Game of Thrones". A influência da série da HBO é nítida, mas também há muito da Disney.
Dizer que a produção é esmerada é pouco.
A Folha acompanhou o primeiro capítulo em uma sala de cinema em São Paulo (outras sessões aconteceram em algumas capitais brasileiras, ao mesmo tempo que a novela ia ao ar).
Mesmo com as imagens em alta definição projetadas na tela grande, é impossível dizer onde termina a cidade cenográfica e começa a computação gráfica. Os figurinos também impressionam, pela riqueza de detalhes.
As linhas gerais da trama foram traçadas com clareza. Dois fictícios reinos vizinhos, Montemor e Artena, entram em conflito. O primeiro tem ferro, o segundo tem água, mas será difícil chegar a um acordo bom para ambos.
As interpretações escapam do naturalismo habitual.
Na boca de atores tarimbados, como Marco Nanini (que faz Augusto, o rei de Artena), o texto solene de Daniel Adjafre flui sem problemas.
Mas o elenco mais jovem ainda precisa de mais treino -com exceção de Johnny Massaro (Rodolfo, o príncipe boêmio de Montemor), que exala a segurança de um veterano.
Uma cena de luta entre nobres e salteadores teve pouco sangue se comparada às de séries como "Vikings" (Fox), o que é compreensível dado o horário. Mas evitou-se o tom de conto de fadas: não há toques de magia nem passarinhos falantes.
Ainda falta humor -Tatá Werneck não apareceu no primeiro episódio-, e é cedo para dizer se essa aposta caríssima vai funcionar.
Mas, pelo menos, "Deus Salve o Rei" -infinitamente mais bem-feita que "Belaventura" (Record), de proposta similar- é uma novidade muito bem-vinda.